O Mundo Devia Ser Um Túnel
JPP 2004
Klaus é um homem alto. Conheceu Johana porque ela olhou por cima de uma sebe verdíssima e olhou por cima de uma Primavera ainda mais verde que a sebe.
Eles costumavam brincar:
'Se tu fosses tão alto, não te teria visto por cima da sebe.'
E Klaus dizia a Johana:
'Se eu não fosse tão alto a sebe seria mais baixa.'
Klaus acreditava mais no destino que Johana. Porém nunca há duas mudanças no mundo para um único efeito. Se Klaus fosse mais baixo, isso constituiria uma mudança no mundo. Se a sebe fosse também mais baixa, seriam duas mudanças no mundo. Se existissem dois factos diferentes no passado então não poderia ter sucedido o mesmo. O destino tem uma lógica própria. São necessários cálculos complexos para perceber o que poderia ter acontecido em vez do que realmente aconteceu. Há demasiadas possibilidades para que aconteça sempre o mesmo. O mundo tem variedade e é longo. O mundo deveria ser um túnel, onde entravas de manhã e saías de noite. Sem ramificações. Uma canalização orientada, como existe nas casas. Abres a torneira e sabes que sai água. Ou então não sai água. Só existem duas possibilidades.
Gonçalo M. Tavares, Um Homem: Klaus Klump, Ed. Caminho, 2003.
3 Comments:
Belíssimo livro.
:)
Um túnel demasiado sem saída. Assim seria a vida, se fosse um túnel. A simplicidade infantil de Gonçalo Tavares é desconcertante.
Desinteressante certamente que seria precisamente porque a maior certeza seria a de que saberíams 'aqui é a entrada e aqui é a saída'. O que faz com que a vida não seja um túnel são as emoções e as sensações. É aí que perdemos a noção do tempo e do espaço...
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